Gabriel
Foto: Daniel Carvalho Gonçalves
Num pequeno mundo (fim de mundo) dum vilarejo
Ouviam-se risos de felicidade, ensejo
Do nascer de um anjo. Assim todos pensavam.
Eis que nasce, enfim, o fruto tão abençoado,
Inocente e indefeso, sem saber seu fado,
Em nada semelhante ao que todos esperavam.
Sua pele não era alva, nem azul o seu olhar.
Tinha no peito a mácula de uma espada,
E isso despertou preconceito naquela gente.
"Um demônio", julgavam, "paz não teremos jamais".
Na infância, Gabriel só teve amor dos pais,
Ninguém tinha contato com alguém tão diferente.
Vivia sozinho, culpado por todos os erros,
Mesmo os que não eram seus, o anjo imperfeito.
A rudeza aumentava com o passar dos anos.
Então, um dia, conheceu Serena,
Deusa frágil, na magia duma noite morena,
Prima vez que alguém olhou além do preconceito
E viu sua alma radiante de bondade,
Ah, primeira vez que alguém o amou de verdade,
Dividiu com ele a cumplicidade dum sorriso.
Mas, ai!, como são injustos os golpes do destino,
Como podem os ignorantes serem tão ferinos!
Ai!, lágrimas são possíveis mesmo no paraíso.
Serena desapareceu sem deixar notícia.
De repente, todos o olhavam com malícia,
Todos o acusavam da sua morte, sua dor
Era ignorada, e Gabriel foi condenado
Por puro preconceito. "Ele não era uma anjo,
Por isso a a matou", disseram. Não viram seu amor,
Nem ouviram seu grito dolente, nem os seus sonhos
Caírem precipício abaixo, tão tristonhos
E fúnebres qual a maldição dum fado bisonho.
Daniel Carvalho Gonçalves
Escrito em 24 de setembro de 1996
Abraço!
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